Unidos contra o preço alto

Os valores cobrados por apartamentos no novo setor assustam alguns consumidores. Associação que já reúne mais de 100 cadastrados quer negociar com as construtoras para baratear os imóveis



Os primeiros apartamentos do Noroeste começaram a ser vendidos em agosto, mas o mercado imobiliário continua aquecido com a negociação de imóveis no novo setor. Nem mesmo o preço salgado afugenta os compradores, embora algumas pessoas que sonhavam morar ali tenham se assustado com os valores dos imóveis. Uma unidade de três quartos, por exemplo, é anunciada por mais de R$ 1 milhão. Para não ficar de fora do bairro, no mês passado, um grupo de consumidores criou a Associação de Compradores de Imóveis do Setor Noroeste, com o objetivo de mobilizar os interessados que não têm condições de pagar R$ 8,2 mil pelo metro quadrado. A entidade já soma 120 associados. A intenção agora é conversar diretamente com as construtoras e, assim, lutar por um preço mais justo para os imóveis. A associação que representa as empresas do setor imobiliário reconhece que esse tipo de conversação é possível. 

A Associação de Compradores de Imóveis do Setor Noroeste foi criada pelo economista e empresário Lindolfo Cavalcanti de Magalhães, 66 anos. Depois de fundar a entidade com um grupo de amigos que compartilhavam de suas ideias, ele distribuiu 10 mil panfletos durante um salão imobiliário, realizado em novembro no Centro de Convenções. “Nós não vamos aceitar preços exorbitantes por parte das construtoras. Afinal, elas precisam mais de nós do que precisamos delas. Só vamos conseguir baixar os preços negociando em grupo”, diziam os panfletos. 

A ideia motivou outras pessoas, que entraram em contato com Lindolfo e se cadastraram. “Desde que começaram a falar no Noroeste, há mais de 10 anos, sonho com um apartamento na região. Mas quando o setor foi lançado, fiquei assustado com os preços. É uma bolha imobiliária que vai estourar a qualquer hora. Precisamos negociar, porque isso está se refletindo nos preços da cidade inteira”, justifica Lindolfo. “Vamos contratar um engenheiro para fazer uma planilha de custos e, assim, apurar o que seria um preço justo. Mas acho que o preço do metro quadrado não deveria nunca ultrapassar os R$ 7 mil”, acrescenta o economista. 

O advogado Edino Franzio, que também integra a Associação de Compradores de Imóveis do Setor Noroeste, acredita que os valores cobrados atualmente não refletem a realidade do mercado. “Nossa expectativa é chamar a atenção da sociedade para o que está acontecendo. Os preços que estão sendo cobrados são totalmente irreais, precisamos nos mobilizar para termos poder de negociação”, afirma Edino. “O que queremos é um preço justo, o valor real de mercado. A partir de fevereiro, com o fim do recesso e das férias, acredito que a mobilização será grande”, acrescenta o advogado. 

Vendas aquecidas 
Apesar das reclamações quanto ao preço, as vendas não param nos estandes que negociam unidades no Noroeste. Até agora, oito prédios foram lançados e as construturas já venderam cerca de 700 apartamentos. O número de projeções vendidas pela Companhia Imobiliária de Brasília é bem superior. Até agora, o GDF já vendeu 103 lotes de prédios no novo bairro, 92 residenciais e 11 mistos, ou seja, destinados a comércio, mas que comportam quitinetes ou pequenos apartamentos. Com o lançamento de apenas quatro editais de licitação, a Terracap arrecadou R$ 1,3 bilhão ano passado. Estão previstos 220 prédios residenciais, distribuídos em 20 quadras. O bairro terá 40 mil moradores. 

O valor das projeções licitadas pelo governo é uma das justificativas usadas pelas construtoras para o alto preço dos apartamentos. Na primeira concorrência pública, em janeiro do ano passado, o governo estabeleceu o preço mínimo do lote para prédios residenciais em R$ 10,3 milhão. No mês passado, os mesmos terrenos tinham valor mínimo de R$ 15 milhões na licitação, o que representa um aumento de quase 50% em menos de um ano. Como cada terreno de mil m² tem potencial construtivo de 6,3 mil m², a construtora tem que cobrar R$ 2,3 mil por metro quadrado só para pagar o investimento da compra do lote. 

O presidente do Sindicato das Indústrias da Construção Civil, Elson Póvoa, diz que o preço alto do terreno é a principal causa de os apartamentos do Setor Noroeste serem tão caros. “Não temos como pressionar um órgão público a vender as projeções a preços mais baixos. É um leilão com lance fechado e, além disso, trata-se de um bem público que tem que ser vendido a valores de mercado. Fica difícil negociar”, explica Élson. “O Noroeste não foi criado para ser um bairro popular. Os prédios terão acabamentos de alto luxo e, além disso, existe a questão da sustentabilidade. Temos que fazeredifícios com (1)energia solar, reuso de água, coleta de lixo a vácuo. Tudo isso encarece muito os preços”, acrescenta o presidente do Sinduscon. 

Fluxo de caixa 
Para o presidente da Associação dos Dirigentes de Mercado Imobiliário, Adalberto Valadão, há espaço para negociação com os clientes. Mas isso vai depender das condições financeiras de cada empresa. “Se essa entidade que quer negociar preços tiver um grande número de associados, é claro que as empresas terão interesse de ouvir as propostas. Com mais de 30 interessados, por exemplo, já seria possível negociar”, afirma. 

Adalberto Valadão, entretanto, não faz projeções de quanto o valor final do imóvel pode baixar nas negociações. “Cada construtora tem uma realidade diferente. Elas terão que analisar o fluxo de caixa para saber se o desconto proposto é possível”, afirma o presidente do Ademi. Hoje, os imóveis são vendidos na planta e a previsão de entrega é de três anos. 

O valor de R$ 8,2 mil para o metro quadrado na planta mostra que a tendência pode ser de alta. Desde o lançamento do primeiro empreendimento, as obras de infraestrutura avançaram. À época do início das vendas, não havia sequer estandes, nem ruas abertas. Agora, há máquinas de obra em todo o bairro, principalmente às margens da Epia — o primeiro trecho a ser inaugurado. 

1 - Bairro verde 
O Setor Noroeste é chamado de “o primeiro bairro ecológico do Brasil”. Além das exigências ambientais dos projetos, outro diferencial é a proximidade com o futuro Parque Burle Marx. O setor é integrado à unidade ecológica, que vai dividir o Noroeste da Asa Norte. 

Interessado?

Para se cadastrar ou obter mais informações sobre a Associação de Compradores de Imóveis do Setor Noroeste, basta acessar o site www.ascin.com.br


Memória
Quem comprou pela Encol assumiu obras

A união de consumidores em associações costuma render bons resultados. Em 1999, a falência de uma das maiores empresas do setor de construção civil levou à criação da Associação Nacional de Clientes da Encol. Quando quebrou, a empreiteira deixou 55 obras inacabadas no Distrito Federal e mais outras 457 pelo Brasil, além de dívidas de R$ 1,8 bilhão, incluindo R$ 150 milhões em débitos trabalhistas e R$ 675 milhões em impostos não pagos. 

Na capital federal, a maioria das construções era de prédios residenciais. Para continuar as obras, os cerca de 42 mil proprietários tiveram que assumir as dívidas da empresa, caso contrário os bens entrariam para a massa falida. A associação assumiu os empreendimentos e, na maioria dos casos, terminou os prédios abandonados no meio da construção. Mas a empreitada custou caro: o preço das obras ficou muito superior ao inicialmente previsto e muitas pessoas não conseguiram quitar o imóvel. Somente no Sudoeste, a Encol deixou 27 prédios inacabados. Todos foram concluídos com o trabalho da Associação Nacional de Clientes da Encol.