Denúncia
Passos é acusado de furto
Falsário preso pela Polícia
Federal acusa empresário Márcio Passos de pagar R$ 12 mil pelo roubo de quatro
processos em varas de Sobradinho e Brasília. Denunciante surrupiou 16 autos
Ana
Lúcia Moura e Dante Accioly
Da equipe do Correio
A Polícia Federal
(PF) vai abrir inquérito para apurar o envolvimento do empresário Márcio
Passos em um esquema de furto de processos judiciais. Dono da Lumiar
Empreendimentos Imobiliários S/A e amigo próximo do governador Joaquim Roriz,
o empresário é acusado de pagar pelo sumiço de quatro autos que tramitavam em
varas de Brasília e Sobradinho.
O esquema foi descoberto há um mês, após a prisão do
falsificador José Ronaldo Silveira. Ele foi autuado em flagrante quando usava
uma carteira falsa da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para surrupiar um
processo no Fórum de Planaltina.
Preso desde 5 de outubro na PF, o falsificador admite ter recebido
dinheiro para sumir com 16 autos em Brasília, Curitiba e Rio de Janeiro. Ele
furtou documentos no Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF), Tribunal
Regional do Trabalho (TRT), Tribunal Superior do Trabalho (TST) e Superior
Tribunal de Justiça (STJ).
José Ronaldo Silveira aponta Márcio Passos como um de seus
clientes mais assíduos. O nome do empresário é citado 21 vezes nos
depoimentos que o falsificador prestou ao Ministério Público do Distrito
Federal e Territórios (MPDFT).
Segundo a versão de José Ronaldo, o empresário desembolsou R$ 12
mil pelo sumiço de quatro autos — R$ 3 mil por cada um deles — em períodos
distintos. O primeiro processo foi retirado da vara criminal de Sobradinho no
ano passado. Os outros três, conta o falsificador, foram furtados este ano na
vara cível de Sobradinho, no arquivo central do TJDF e em uma das varas da
Fazenda Pública, em Brasília. O MPDFT confirma o desaparecimento dos
processos, mas não detalhou quais autos foram subtraídos.
Quando um processo desaparece, o Poder Judiciário é obrigado a
fazer a reconstituição completa dos autos — algo que demora pelo menos 5
anos. O tempo é suficiente para a prescrição de alguns crimes. Processo
sumido, causa encerrada.
Para furtar o primeiro processo supostamente encomendado por Márcio
Passos, José Ronaldo Silveira usou uma carteira da OAB em nome de Jorge Alberto
Campos. Para os outros três furtos, ele diz ter usado uma carteira em nome do
advogado Sérgio Leverdi.
José Ronaldo explica que os processos encomendados por Márcio
Passos eram de interesse da Lumiar Empreendimentos. Ele dá detalhes sobre a
participação do empresário no esquema. ‘‘Os processos foram entregues a Márcio
Passos, sendo um deles no estacionamento da empresa Lumiar e os outros três,
dentro do escritório de Márcio na empresa Lumiar, no mesmo dia em que subtraídos’’.
Dinheiro vivo
A próxima ação já estaria acertada: ‘‘Márcio Passos também havia
combinado que o declarante (José Ronaldo Silveira) deveria retirar dois inquéritos
policiais da Dema (Delegacia Especial do Meio Ambiente), onde estavam envolvidos
tanto o Márcio quanto (o irmão) Pedro Passos’’. José Ronaldo recebia o
pagamento em dinheiro vivo.
O depoimento de José Ronaldo trouxe mais elementos para a investigação
da Polícia Federal sobre o furto de processos em tribunais. Desde setembro, os
investigadores tinham conhecimento do sumiço de autos. No dia 11, o presidente
do STJ, ministro Paulo Costa Leite, determinou que a corporação investigasse o
desaparecimento de um recurso especial. A Polícia Federal também foi
notificada pelo TRT, onde foi registrado o desaparecimento de uma ação
trabalhista contra a empresa Dom Taco Fiesta.
José Ronaldo Silveira foi indiciado por furto, formação de
quadrilha e uso de documento falso. A reportagem do Correio telefonou para o
empresário Márcio Passos na tarde de ontem. Ele não estava na sede da Lumiar
Empreendimentos e não retornou a ligação.
Flagrante
ocorreu em Planaltina
Em depoimento ao
Ministério Público do DF, José Ronaldo revelou o envolvimento de ex-policiais
no esquema de furtos de processos judiciais. O falsificador conta que os
ex-policiais McRaff Camargo e Davi Cruz o procuraram para acertar o furto do
auto número 2165-2 do Fórum de Planaltina. Nesse processo, McRaff Camargo é
acusado de roubo. Pelo trabalho, José Ronaldo receberia R$ 6 mil. McRaff
Camargo e Davi Cruz também respondem a um segundo processo na Vara Criminal de
Planaltina, este por homicídio.
Por volta das 13h20 do dia 25 de setembro, José Ronaldo chegou ao Fórum
de Planaltina. No balcão da vara criminal, ele apresentou a carteira falsa da
OAB com o nome do advogado Sérgio Leverdi Campos Silva.
Mas José Ronaldo cometeu um erro. Para retirar os autos sem
comprometer McRaff, ele disse ser representante de Plácido José Macedo Júnior
— co-réu no mesmo processo de roubo. Mas não atentou para um detalhe: Plácido
está morto e, portanto, excluído do caso desde fevereiro.
Desconfiança
Desconfiada de José Ronaldo, uma funcionária da vara comunicou o fato à juiza
Maria da Graça Aragão, que acionou a 16ª Delegacia de Polícia (Planaltina).
José Ronaldo foi preso e autuado em flagrante por tentativa de furto.
Junto com ele, foi preso Gildenor Silva, que o teria levado ao Fórum
em troca de R$ 80. Preso durante alguns dias na 3ª Companhia de Polícia
Militar Independente (3ªCPmind), José Ronaldo foi transferido para a
carceragem na Polícia Federal.
Em depoimento ao MPDF, José Ronaldo revelou o esquema de furtos de
processos. Ele citou não só o autor da encomenda do processo que seria
retirado do Fórum de Planaltina, como também todas as pessoas para os quais já
trabalhou.
O delegado Antônio Celso dos Santos, da Delegacia de Controle de
Segurança Privada (Delesp) da PF, apresentou ao juiz da 12ªVara Federal, na última
sexta-feira, o inquérito sobre o desaparecimentos dos processos no STJ e no
TRT. Ele sugeriu a abertura de uma segunda investigação para apurar a
participação de todos os citados por José Ronaldo, entre eles o empresário
Marcio Passos. (A.L.M. e D.A)