Mulheres já ocupam 10% das vagas nas portarias dos prédios da capital Atenciosas e responsáveis, elas conquistaram a confiança dos síndicos e moradores

O visitante chega ao prédio e, em vez de um porteiro, se depara com uma mulher dentro da guarita, controlando quem entra e sai do edifício e atenta às câmeras de segurança. Enquanto a moça cumpre várias tarefas simultâneas, ele, desatento, pergunta: “A senhora pode chamar o porteiro, por favor?”. O visitante fica surpreso com a resposta: “O senhor está falando com ele”. A cena ocorreu recentemente em um bloco residencial da Asa Sul. O engano se justifica. Comandar a portaria, até pouco tempo, estava entre as funções consideradas típicas deles.
Alguns empregadores alimentam a ideia de que, pela força física, homens impõem mais respeito. Esse conceito, porém, começa a perder espaço nessa profissão. De acordo com dados do Sindicato dos Trabalhadores em Condomínios e Imobiliárias (Seicon), há, em média, 10 mil porteiros no Distrito Federal. Desses, pelo menos 10% — mil — são mulheres. Vestidas em ternos pretos e de salto alto, elas são as responsáveis por guardar a segurança dos lares de milhares de famílias em todo o DF.

Na 212 Norte, as profissionais do sexo feminino têm a preferência dos síndicos. Três prédios da região são cuidados por porteiras. Os administradores dos condomínios garantem: o serviço melhorou com a chegada delas. “Mulheres, em geral, são mais atenciosas, responsáveis. Elas prezam pelo emprego, afinal, há mais vagas para homens do que para elas nessa área”, afirma o síndico do Bloco I da 212 Norte, Flauzino Gonçalves. Apesar de zelarem pelo bem-estar dos moradores, é preciso diferenciar as tarefas exercidas por elas das realizadas por seguranças. “Se alguém chegar aqui armado querendo assaltar, nenhum dos dois poderá evitar. Essa não é a função do porteiro. Ele é um guardião, precisa vigiar constantemente, identificar estranhos”, esclarece Gonçalves.

Há quatro anos, a agente de portaria Simone Ferreira da Silva, 32 anos, passou a trabalhar no Bloco I da 212 Norte. O primeiro cargo foi o de faxineira, e ela logo recebeu uma promoção. “No começo, tive de aguentar as piadinhas dos colegas. Eles achavam até que eu estava envolvida com o patrão. Puro preconceito. Mas respeito a gente dá para receber. Hoje, todos me tratam com igualdade”, diz Simone. Moradora de Santa Maria, ela sai de casa cedinho, às 5h, e pega um ônibus lotado. Antes das 7h30, ela já está no trabalho. Cumpre escala de 12 horas e folga 36 horas, ou seja, trabalha dia sim, dia não. “Nós, mulheres, somos capazes de tudo”, garante.

Bons exemplos
O prédio em que Simone trabalha conta ainda com uma zeladora, Maria Benilde dos Reis, 44 anos, moradora de Sobradinho, que festeja ao ver as conquistas femininas. “Lá em casa, eu troco lâmpada, faço todo o serviço pesado. Temos uma presidente mulher. Homens dão problema demais: bebem, perdem a hora, faltam ao serviço e arrumam rabo de saia para se distrair”, brinca a zeladora.

Em frente ao Bloco I da 212 Norte fica o edifício K, também com uma mulher na portaria. Lá, o nome da encarregada pelo serviço é Cláudia Costa Brito, 36 anos, moradora de São Sebastião. É ela quem, há 10 anos, autoriza as entradas e monitora o movimento. Cláudia é a mais experiente porteira da quadra. “Os moradores gostam muito da ideia de ter uma mulher na portaria. Mas, infelizmente, a gente ainda sofre preconceito. Tem gente que pensa: ‘Elas não vão conseguir.’”

Perto dali, no Bloco H, é Sirlei Roman Ros, 41 anos, que vive no Varjão, a responsável por atender os condôminos e visitantes. Ela começou a trabalhar por convite de uma moradora. Antes de ser porteira, Sirlei era atendente em uma loja. “O trabalho que tenho hoje é gratificante, porque demanda muita responsabilidade e confiança. A mulher precisa, ao mesmo tempo, ser séria e simpática”, ensina Sirlei.

A presença dessas profissionais é vista hoje em várias regiões do DF. No Centro de Atividades do Lago Norte, também há mulheres nas guaritas. Rosecleide Izibro da Silva, 25 anos, é uma delas. Está há seis anos no cargo e é o braço direito da síndica. “Nunca tive problema. Nós atendemos melhor as pessoas, somos mais organizadas, conversamos melhor. Só temos vantagens e competência”, diz, orgulhosa. Nas horas de folga, Rosecleide faz faxinas. Com o esforço, já conseguiu comprar um carro. O salário da categoria é em média, de R$ 650.

Apesar desses exemplos, segundo o diretor do Seicon, Paulo Inácio Cardoso, a maior parte dos patrões ainda procura por homens. “Quem pensa desse jeito ainda não conhece a força das mulheres. Elas dão de 10 a zero em muitos homens por aí, usando só a força intelectual”, elogia. A síndica do Edifício Porto do Lago, localizado no Lago Norte, Maria Nilza Guimarães, defende a contratação feminina. “Temos uma mulher trabalhando conosco e já pensamos em contratar várias outras.”

O trabalho que tenho hoje é gratificante, porque demanda muita responsabilidade e confiança. A mulher precisa ser séria e simpática, ao mesmo tempo”

Sirlei Roman Ros

Os moradores gostam muito da ideia de ter uma mulher na portaria. Mas infelizmente a gente ainda sofre preconceito. Tem gente que pensa: elas não vão conseguir”

Cláudia Costa Brito

Nós atendemos melhor as pessoas, somos mais organizadas, conversamos melhor. Só temos vantagens e competência”

Rosecleide Izibro da Silva